Este livro apresenta os resultados de pesquisa in�dita da professora Lidia Maria Vianna Possas sobre o impacto da implanta��o das ferrovias paulistas na sociedade conservadora do interior do estado de S�o Paulo nos primeiros anos do s�culo XX. O livro faz parte da Cole��o Hist�ria da Edusc - Editora da Universidade do Sagrado Cora��o.
A autora resgata as experi�ncias sociais das mulheres nas ferrovias paulistas; evidencia as possibilidades de observa��o de perman�ncias e mudan�as numa realidade onde emerge um novo papel feminino. Descreve o impacto das ferrovias - s�mbolos do avan�o do capitalismo e da modernidade - na vida das mulheres de Bauru e do interior do estado de S�o Paulo.
A cidade Bauru, centro geogr�fico do estado e "boca do sert�o" paulista, virava a "entrada do Brasil novo", com o nascimento da estrada de ferro Noroeste do Brasil (NOB ), em 1905 e a chegada das ferrovias Sorocabana (1906) e Paulista (1910). A modernidade estava � flor da pele, com a dissemina��o de novos valores pelo r�dio, cinema, teatro e romances.
Bauru, entroncamento destas tr�s ferrovias, viu nascer, no in�cio do s�culo passado, a perspectiva de novos horizontes para trabalhadores vindos de muitas partes do Pa�s. N�o poderia ser diferente para com os anseios e aspira��es femininas da �poca. As mulheres da cidade come�avam a buscar novos rumos, deixando os tradicionais afazeres dom�sticos para lan�arem-se ao sonho de fazerem parte do mercado de trabalho.
Fortalecia-se nas mulheres a aspira��o de ser moderna, de trabalhar fora de casa. Mais que independ�ncia financeira, isso significava um forte rompimento de valores, o que n�o era bem visto pelos homens e pela tradi��o familiar. "A companheira se tornava uma amea�a", lembra Lidia Possas. "A mulher que trabalhava fora n�o era considerada mulher de fam�lia. O ass�dio sexual no trabalho era grande e as mulheres tinham que ser muito austeras para controlar sua sexualidade", acrescenta.
Na ferrovia, as fun��es exercidas pelas mulheres eram divididas basicamente em duas �reas: as escritur�rias e as bra�ais. As primeiras vinham de fam�lias de classe m�dia, com certa forma��o escolar, e trabalhavam como telefonistas, datil�grafas e servi�os burocr�ticos em geral. As outras, de fam�lias menos favorecidas, iam para a cozinha, lavanderia, faxina, atendimento e outros servi�os.
"O primeiro edital que anunciou concurso para a NOB, aberto a homens e mulheres acima de 18 anos, data de 1938, divulgado no r�dio. Era uma estrat�gia Get�lio Vargas para se aproximar do eleitorado feminino, que ganhou seu direito ao voto em 1934. Por isso as mulheres daquela �poca adoravam Get�lio", afirma a professora Lidia.
Vasculhando a documenta��o desses concursos, Lidia Possas descobriu, ainda, que os primeiros lugares nos concursos eram em grande parte conquistados pelas mulheres.
O esquema disciplinar das ferrovias acabou afetando as mulheres tamb�m dentro de casa. Em alguns depoimentos de familiares, Lidia constata que as ferrovi�rias transferiam para o lar, com os filhos, a disciplina da empresa. "Da� conclui-se tamb�m que a ferrovia forma car�ter", diz a pesquisadora.
Outro aspecto curioso registrado pela professora foram as formas de romance estabelecidos entre ferrovi�rios. "S�o bilhetes, recados, cadernos de recorda��es; tudo era muito secreto, pois se descoberto, um romance dentro da empresa poderia causar problemas aos funcion�rios", lembra.
"Mulheres, trens e trilhos", rico em depoimentos, ilustra��es, fotos da �poca, c�pias de documentos e cita��es te�ricas, � um trabalho com apurado rigor acad�mico, sem, no entanto, perder o olhar sens�vel �s transforma��es culturais: "� hist�ria sob uma perspectiva antropol�gica", define Lidia Possas.
Lidia Maria Vianna Possas graduou-se em Hist�ria pela Universidade Fluminense (1968), concluiu seu Mestrado em Hist�ria e Sociedade na UNESP (1992) e doutorou-se em Hist�ria Social pela USP (1999). Lecionou em diversas universidades e faculdades paulistas e atuou em v�rias institui��es educacionais, onde proferiu palestras e promoveu cursos.