Not�cias de uma Universidade: a greve estudantil da FFLCH/USP (2002)
Autor(es):
Maria Ligia Coelho Prado (Organizadora)
Editora:
Humanitas
Ano:
2003
Nº de páginas:
169
Este livro � o resultado da organiza��o de uma s�rie de trabalhos de pesquisa, sobre o tema da universidade, elaborados por alunos de gradua��o do curso de Hist�ria da FFLCH/USP. Come�ou na disciplina optativa Hist�ria das Id�ias, por mim ministrada no per�odo noturno, no primeiro semestre de 2002. O programa proposto tinha por t�tulo, �Id�ias Pol�ticas e Concep��es de Universidade na Am�rica Latina�. No curso, pretendi fazer uma discuss�o sobre v�rias concep��es de educa��o e de universidades na Am�rica Latina, desde o per�odo colonial at� o presente, enfatizando as rela��es entre as id�ias e as sociedades. Minha preocupa��o era a de pensar as aproxima��es e os distanciamentos entre a hist�ria da universidade no Brasil e nos pa�ses de coloniza��o espanhola. Uma unidade importante do curso analisava a funda��o da USP, em 1934, as reformas do ensino superior de 1969, encerrando com uma reflex�o sobre os problemas atuais da universidade p�blica no Brasil e na Am�rica Latina.
A classe contava com mais de 100 alunos, em sua maioria j� no terceiro ou quarto anos. O curso seguia normalmente, quando o primeiro an�ncio da greve dos estudantes da Faculdade, iniciada nos cursos de Letras, foi dado, no dia 6 de maio de 2002, exatamente no meu curso. A surpresa dos alunos, a imediata ades�o de muitos e a inconformidade de outros explodiram primeiramente numa forte discuss�o sobre a paralisa��o.
Creio que a greve dividiu o curso em duas partes, n�o apenas pela interrup��o for�ada. Quando voltamos �s aulas, no m�s de agosto, sem pretender usar frases feitas, �j� n�o �ramos os mesmos�. De minha parte, havia proposto certas altera��es de conte�do do curso, enfatizando alguns temas e quest�es que emergiram a partir da greve. Da parte dos alunos, essa experi�ncia os havia marcado profundamente � tanto aqueles que apoiaram como aqueles que foram contr�rios ao movimento � tornando-se mais conscientes dos problemas da universidade p�blica. Portanto, eles n�o podiam mais assistir �quela disciplina da mesma maneira.
Por uma interessante coincid�ncia, havia oferecido aos alunos, no in�cio do curso, tr�s possibilidades de avalia��o. A primeira, uma prova nos moldes tradicionais; a segunda, uma reflex�o cr�tica sobre uma das obras da bibliografia do curso; a terceira, um trabalho de pesquisa em jornais que tinha por objetivo levantar e analisar as mat�rias publicadas sobre universidade em geral e sobre a USP em particular. Sugeri que fossem acompanhados O Estado de S. Paulo ou Folha de S. Paulo. Uma pequena minoria (todos dos �ltimos anos do curso) optou pela terceira alternativa que era, obviamente, a mais trabalhosa e dif�cil. A greve surpreendeu esses alunos que passaram a ter um volume muito maior e mais complexo de materiais para manusear.
Ao t�rmino do curso, ao ler os trabalhos finais, fui tomada por grande satisfa��o. Havia alguns escritos que me entusiasmaram pela qualidade e pelo bom n�vel. Isto me alegrava muito, porque mostrava que o Departamento de Hist�ria da FFLCH havia oferecido �queles alunos uma s�lida forma��o que lhes permitia realizar a pesquisa, ler criticamente a bibliografia indicada e saber refletir sobre o material levantado. Selecionei alguns trabalhos e apresentei aos autores a proposta de sua publica��o na forma de livro.
Depois de algumas reuni�es, fechamos a organiza��o do livro. Todos os trabalhos foram reescritos por eles e revisados por mim. Partimos dos temais mais gerais em dire��o aos mais particulares. O texto que abre o livro discorre sobre a concep��o liberal de universidade, com �nfase no espa�o da Am�rica Latina; percorre o s�culo XIX, e se det�m na an�lise das reivindica��es da Reforma Universit�ria de C�rdoba de 1918, e sua repercuss�o na Am�rica Latina; e no final, reflete sobre as transforma��es recentes da universidade, j� distante do modelo liberal cl�ssico e cada vez mais pr�xima das exig�ncias imediatas do mercado capitalista. O segundo trabalho apresenta a funda��o da Universidade de S�o Paulo, situando-a no contexto s�cio-pol�tico da d�cada de 1930; depois analisa as mudan�as ocorridas na reforma de 1969 e seus desdobramentos atuais. O terceiro faz um hist�rico da greve estudantil da FFLCH/USP em 2002, passo a passo, come�ando por entender os fatores que desencadearam o movimento. Entrando diretamente nas pesquisas efetivadas, o artigo seguinte discute os problemas de trabalhar com o jornal como fonte para o historiador. Os tr�s �ltimos textos debatem especificamente as posi��es de O Estado de S. Paulo, e da Folha de S. Paulo a respeito da greve, do lugar da Faculdade de Filosofia, do papel da USP, da quest�o do mercado e dos embates entre universidade p�blica/universidade privada.
Propus, tamb�m, que cada um dos alunos escrevesse especialmente para o livro um pequeno depoimento sobre sua experi�ncia pessoal e pol�tica durante os meses de greve. Esse conjunto possibilita que o leitor tenha uma vis�o mais ampla do que foi essa experi�ncia, especialmente porque os �ngulos abordados s�o diversificados; al�m disso, cinco depoimentos s�o de alunos favor�veis ao movimento e, um, de aluno contr�rio � greve, mas que participou do processo de discuss�es.
Creio que essa longa paralisa��o dos alunos da FFLCH/USP foi um movimento important�ssimo que alcan�ou resultados muito positivos em termos de reivindica��es iniciais. Ela deu a n�s, professores, uma medida da organiza��o e da determina��o do movimento estudantil. Os alunos pensaram na institui��o p�blica, correram o risco de perder o ano, e assumiram um compromisso pol�tico conseq�ente. Como sempre, ao lado de um grupo de lideran�a combativa, dedicada e politicamente inteligente, havia uns 3 ou 4 alunos que falavam nas assembl�ias e mostravam seu despreparo e oportunismo. Mas isto tamb�m faz parte dos movimentos pol�ticos que, como se sabe, abrem espa�o para opini�es diversas.
Para finalizar, gostaria de me dirigir especialmente aos seis alunos autores deste livro: Gabriel, Gilberto, Jo�o Vicente, Leandro, Maria Cec�lia e Uiran. J� disse outras vezes que os alunos s�o o sal da vida universit�ria. Com esse trabalho, reafirma-se esta tese. O empenho e o entusiasmo com que eles se dedicaram a este projeto foram exemplares. A qualidade intelectual dos textos indica que a universidade p�blica vem cumprindo seu papel adequadamente, pois oferece as condi��es concretas para a realiza��o de um trabalho conjunto � professor e alunos � de produ��o do conhecimento. H� certos momentos na vida profissional, em que tudo parece fazer sentido. Para mim, este foi um deles.
Maria Ligia Coelho Prado
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Fone: (11) 3091-4589 com Nilda ou Alzira (Editora Humanitas FFLCH/USP)