Atualizado em 29 de mar�o de 2004
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Hist�ria Geral

Novas revela��es sobre os vikings


Johnni Langer

Os guerreiros mais famosos da Idade M�dia foram os habitantes da Escandin�via, conhecidos atualmente como vikings. In�meras can��es, romances e filmes celebram seus feitos. Mas apesar dessa grande fama, a sua verdadeira cultura esconde-se atr�s de muitas falsas id�ias, de interpreta��es err�neas da Hist�ria � os estere�tipos.


O mais conhecido dos estere�tipos relacionados aos vikings, mas tamb�m atribu�dos a outros b�rbaros (como celtas e sax�es), s�o os capacetes com chifres laterais. Sabemos hoje pelos recentes estudos arqueol�gicos que os verdadeiros elmos de batalha de todos os povos da Europa pr�-crist� e da Idade M�dia eram c�nicos ou esf�ricos, lisos e sem nenhuma protuber�ncia. At� mesmo aquelas asas no capacete do personagem de quadrinhos Asterix s�o fantasiosas. Mas e como surgiram essas imagens equivocadas? Segundo nossas pesquisas, elas ocorreram em primeiro lugar na Inglaterra em 1830, espalhando-se depois com as manifesta��es art�sticas da Fran�a e Alemanha (LANGER, 2002, p. 6-9). Neste �ltimo pa�s, ap�s a exibi��o da �pera O anel dos Nibelungos, de Richard Wagner (1870), o estere�tipo tanto dos chifres quanto das asas foi tradicionalmente representado na pintura, escultura e literatura. Acreditava-se que os adornos c�rneos simbolizariam o poder guerreiro, o poder masculino dessas antigas culturas. (1) Somente no s�culo XX � que a cultura erudita come�ou a associar essa imagem com maridos enganados pelas esposas... Logo veio o cinema e as hist�rias em quadrinhos, que trataram de popularizar ao m�ximo o estere�tipo dos elmos cornudos. Mesmo hoje em dia, podemos encontr�-lo em alguns manuais de ensino de Hist�ria, ou sendo utilizados por alguns torcedores suecos em �poca de copa do mundo. Mas o empenho de muitos pesquisadores tenta destruir essa imagem equivocada.


Outro famoso estere�tipo associado aos n�rdicos e b�rbaros medievais, � a suposta utiliza��o do cr�nio dos inimigos como copo para bebidas! Na realidade, esse estere�tipo foi inventado muito antes do surgimento dos vikings. (2) No s�culo V depois de Cristo, a Europa sofria os ataques dos hunos, temidos guerreiros da Mong�lia. Um cronista g�tico desse per�odo chamado Jordanis, acreditava que os hunos n�o eram humanos, mas seres bestiais que devoravam crian�as e cometiam terr�veis atrocidades. Ele foi um dos primeiros que descreveu essa pr�tica cruenta: matar, decapitar e transformar as cabe�as em recipientes para bebidas (BEHREND; SCHMITZ, 1994). Claro que foi apenas uma fantasia, pois inventar atrocidades e misticismos sobre os inimigos � um dos mais antigos ardis pol�ticos. Como os vikings tamb�m n�o eram bem vistos na Idade M�dia por atacarem mosteiros e templos crist�os, nada mais �bvio que compar�-los com seres demon�acos. Precisavam ser rebaixados a um n�vel de crueldade sem igual. Imediatamente surgiram representa��es de grandes banquetes e festas, nos qual os guerreiros escandinavos utilizariam o horrendo recept�culo para bebidas. Mesmo em nossos dias esse estere�tipo ainda persiste, a exemplo da cena inicial do filme Escorpi�o Rei.


O terceiro estere�tipo � relacionado com as vestimentas dos vikings. Grande parte das obras art�sticas do s�culo XIX e de muitos filmes posteriores, representaram os b�rbaros vestindo roupas feitas de pele de animais. Algumas cenas, inclusive, idealizavam os n�rdicos mais como homens pr�-hist�ricos do que guerreiros medievais, como a ilustra��o Chegada dos Normandos � Fran�a, de Guizot (1879). Verdadeiros trogloditas cobertos com couro, alguns portando at� clavas e porretes. Sabemos hoje que a maioria dos povos b�rbaros n�o eram t�o b�rbaros assim. Ali�s, esse termo originalmente designava os povos que n�o falavam grego, depois latim e finalmente, os que n�o professavam o cristianismo. Praticamente todos os b�rbaros da Europa elaboravam suas roupas por meio da tecelagem de origem animal. Os vikings fabricavam roupas a partir da l� de carneiros e ovelhas criados em fazendas. Primeiramente a l� era lavada, depois fiada, tecida e tingida. A qualidade era t�o boa que muitas vezes chegou a ser exportada. Os vestidos das mulheres eram muito sofisticados, decorados com excepcionais broches e fivelas de metal (GRAHAM-CAMPBELL, 2001, p. 120-121).


E porque representar os b�rbaros vestindo peles de animais? Uma maneira eficiente de criticar outra cultura � compar�-la ao m�ximo com criaturas �inferiores�. Se sou membro de um povo dito civilizado, que segue regras de conduta de inspira��o divina ou religiosa, ent�o estou muito distante da esfera bestial. Trajando peles pesadas, morando em cavernas ou casas mal elaboradas, os vikings seriam humanos mais pr�ximos dos animais do que das civiliza��es crist�s. � �bvio que o imagin�rio religioso vai associar aos povos pag�os (que n�o seguem a B�blia), toda uma s�rie de atitudes vistas como pecaminosas ou incorretas para uma sociedade considerada �civilizada�: incesto, canibalismo, sacrif�cios de crian�as. Ent�o, se os vikings s�o pag�os, necessariamente fazem tudo isso e � claro, vestem roupas grosseiras!


Outra imagem tipicamente associada aos antigos n�rdicos s�o seus h�bitos alimentares: comeriam somente carne crua, a qual arrancariam com os dentes. Mais uma vez, representa��es fantasiosas procurando caracterizar os vikings como criaturas animalescas e brutais. Mas a arqueologia moderna j� descobriu muitos utens�lios de cozinha, como cuias de madeira, ton�is, cestas de vime, panelas e todos os tipos de recipientes de cer�mica, demonstrando um sofisticado padr�o de cozimento e preparo dos alimentos na cultura n�rdica (HAYWOOD, 2000. p. 73-74).


Mas os b�rbaros teriam sido assim t�o cru�is? � �bvio que os vikings fizeram pilhagens, saques e massacres em diversas cidades europ�ias. Mas nem todos os escandinavos eram piratas. Alguns foram mercen�rios, comerciantes, aventureiros e colonizadores pac�ficos, outros dedicaram-se somente � agricultura. No mundo n�rdico, um guerreiro era t�o respeitado quanto um poeta. E o tema da viol�ncia na Hist�ria � algo que deve ser sempre visto com relatividade. Mesmo os povos crist�os da Idade M�dia cometerem atos que hoje consideramos terr�veis, a exemplo das Cruzadas no Oriente M�dio, o uso da Inquisi��o pela Igreja ou as guerras religiosas. Para os �rabes, os b�rbaros eram os europeus que participavam das Cruzadas, pelos atos horripilantes que executaram perante as popula��es orientais (THOMSON, Oliver. 2002).


Uma caracter�stica que desmente a fama de crueldade extrema dos vikings � a sua �ndole para o humor. Apelidos era muito comuns, mas alguns enfatizavam tra�os opostos � realidade f�sica da pessoa, como Thorald o magro, que na realidade era bem gordo, ou Harald o loiro, para um homem com cabelo escuro. A morte era um momento para celebra��o e alegria, bem ao contr�rio do que nossa civiliza��o preconiza. Mesmo quando um homem era condenado � morte, o sorriso o acompanhava at� o cadafalso (BR�NDSTED, [s.d.], p. 209).


E o �ltimo dos estere�tipos � relacionado a uma suposta for�a sobre-humana dos escandinavos � pois estes, mesmo para o imagin�rio popular contempor�neo, teriam sido homens gigantescos e com grande estrutura muscular. V�rios filmes enfatizam erroneamente que a espada viking n�o poderia ser manejada por outros guerreiros, devido ao seu enorme peso. � certo que o equipamento n�rdico n�o era mais sofisticado que o da Europa medieval, e o que causou impacto foram mais as t�cnicas de guerra adotadas: ataques rel�mpagos e utiliza��o de machados e espadas para serem manejadas por somente uma das m�os. Quanto � constitui��o f�sica, o exame de esqueletos determinou que o tamanho m�dio dos dinamarqueses, noruegueses e islandeses era de 1,70 metros � uma altura igual ao dos outros europeus. Somente os suecos tinham um tamanho mais elevado. O que ocasionou maior diferen�a no momento das batalhas foi a sa�de muito superior dos escandinavos em rela��o ao restante do continente, devido � uma alimenta��o mais equilibrada e rica em prote�nas (GRAHAM-CAMPBELL, James, 1997. p. 72)


Novos estudos historiogr�ficos e descobertas arqueol�gicas est�o revelando muitos detalhes sobre o modo de vida, o pensamento e a riqueza cultural dos vikings. Ela contribuir�o para que desapare�am os diversos estere�tipos que foram elaborados desde o momento em que os n�rdicos surgiram perante o Ocidente e definitivamente deixaram suas marcas, imagin�rias e reais.



Notas

(1) Para outras an�lises sobre ester�tipos dos vikings ver: WAWN, Andrew. The Vikings and the Victorians: inventing the Old North in 19TH-Century Britain. Cambridge: D.S. Brewer, 2002; BOYER, R�gis. Le mythe Viking dans les lettres fran�aises. Paris: Editions du Porte-Glaive, 1986.

(2) Para o arque�logo Holger Arbman, esse estere�tipo teria surgido durante um erro de tradu��o do Setecentos: �resultado de uma tradu��o errada do s�culo XVIII em que se apresenta a express�o �caveiras dos seus inimigos� em vez de �copos feitos de cornos��. ARBMAN, Holger. Os Vikings. Lisboa: Editorial Verbo, 1969. p. 14.


Bibliografia

ARBMAN, Holger. Os Vikings. Lisboa: Editorial Verbo, 1969.

BEHREND, Jens-Peter; SCHMITZ, Eike (Dir.). Attila the hun: king of the barbarians. Berlin: Atlantis Film. ZDF/The Discovery Channel Europe, 1994. VHS, 45 min.

BOYER, R�gis. Le mythe Viking dans les lettres fran�aises. Paris: Editions du Porte-Glaive, 1986.

BR�NDSTED, Johannes. Os Vikings: hist�ria de uma fascinante civiliza��o. S�o Paulo: Hemus, [s.d.].


EDWARDS, Mike. Citas da Sib�ria: mestres do ouro. National Geographic, ano 4, n. 38, junho 2003.

GRAHAM-CAMPBELL, James. Os viquingues: origens da cultura escandinava. Madrid: Del Prado, 1997. v.1.

GRAHAM-CAMPBELL, James (Org.) Weaving & cloth designs. In: ______. The Viking World. London: Frances Lincoln, 2001.

HAYWOOD, John. Food and drink. In: ______. Encyclopaedia of the Viking Age. London: Thames and Hudson, 2000.

LANGER, Johnni. The origins of the imaginary Viking. Viking Heritage Magazine, Centre for Baltic Studies (Gotland, Su�cia), n. 4, 2002.

THOMSON, Oliver. A assustadora hist�ria da maldade. S�o Paulo: Ediouro, 2002

WAWN, Andrew. The Vikings and the Victorians: inventing the Old North in 19TH-Century Britain. Cambridge: D.S. Brewer, 2002.

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