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Livro: � sombra da Revolu��o Mexicana - Hist�ria Mexicana Contempor�nea, 1910 a 1989
Autores: Hector Aguilar Cam�n e Lorenzo Meyer
Editora: Edusp
Ano: 2000
N�mero de p�ginas: 370
Quase tudo o que voc� queria saber sobre o M�xico
Livro recapitula a trajet�ria do pa�s, da Revolu��o de 1910 ao final dos anos 80

Maria L�gia Coelho Prado

N�o � novidade afirmar que no Brasil se publica pouco sobre a Am�rica Latina. Assim, a iniciativa da Edusp de organizar e de dar continuidade a uma cole��o de estudos latino-americanos deve ser ressaltada. Neste volume, o de n�mero cinco, as qualidades da edi��o sobressaem na bela capa, na �tima impress�o e na cuidadosa tradu��o.
� Sombra da Revolu��o Mexicana - Hist�ria Mexicana Contempor�nea, 1910 a 1989 ultrapassa os objetivos iniciais dos autores - o de produzir um manual para ser utilizado por universit�rios - pois oferece ao leitor um texto fluente e interessante ao alcance de todos aqueles que desejam conhecer a hist�ria do M�xico no s�culo 20. Boa oportunidade tamb�m para se estabelecer aproxima��es e diferen�as entre as trajet�rias econ�micas, as escolhas pol�ticas e os problemas sociais do Brasil e do M�xico no contexto latino-americano e mundial.
Aguilar Cam�n e Lorenzo Meyer s�o especialistas em Hist�ria do M�xico no s�culo 20 e dialogam tanto com a historiografia cl�ssica quanto com a mais recente sobre temas relevantes desse longo per�odo, apresentando uma consistente interpreta��o, de forma clara e sint�tica.
Os autores constroem sua tese indicando que a Revolu��o Mexicana abriu a possibilidade para a inven��o de um modelo de Estado e de na��o que tomou forma mais acabada durante o governo de L�zaro Cardenas (1934-1940) e que esteve na base do cont�nuo crescimento econ�mico do pa�s at� o final da d�cada de 1960. A partir da�, o "milagre mexicano" come�ava a se desvanecer, acontecendo sua sistem�tica desestrutura��o. Tal modelo se alicer�ava em uma proposi��o nacionalista de interven��o do Estado na defesa da produ��o interna, numa pol�tica de distribui��o de terras e num executivo forte que controlava os partidos e os sindicatos.
Os dois primeiros cap�tulos sobre a Revolu��o Mexicana de 1910 s�o exemplares. Mostram como os ventos revolucion�rios penetraram por toda a sociedade, pondo em destaque a ativa participa��o dos camponeses. A Revolu��o se estendeu por v�rios anos, deixando aproximadamente um milh�o de mortos. Nesse per�odo, as for�as revolucion�rias repeliram o ataque dos Estados Unidos ao porto de Vera Cruz, protagonizaram dram�ticos confrontos armados e choraram alguns tr�gicos assassinatos como os do presidente Francisco Madero e o do l�der campon�s Emiliano Zapata.
Em 1917, uma Assembl�ia Constituinte escreveu uma nova constitui��o, profundamente nacionalista e anticlerical, que propunha a realiza��o da reforma agr�ria e garantia os direitos dos trabalhadores urbanos. Os impressionantes latif�ndios (alguns com mais de um milh�o de hectares) come�avam a desaparecer e uma outra proposta de na��o se delineava.
A an�lise sobre o importante per�odo do governo de L�zaro Cardenas (1934-1940) nos leva � reflex�o sobre os dilemas e as escolhas dos dirigentes dos pa�ses latino-americanos depois da quebra da bolsa nos Estados Unidos, em 1929. Cardenas enfrentou a crise promovendo uma imensa distribui��o de terras (18 milh�es de hectares) e intervindo para estimular as atividades econ�micas. Num gesto arriscado e corajoso, em 1938, nacionalizou a produ��o de petr�leo, confrontando os interesses das grandes companhias norte-americanas. Por uma s�rie de raz�es, incluindo a proximidade da guerra, saiu-se plenamente vitorioso. Reorganizou o partido nascido da revolu��o, na �poca denominado Partido da Revolu��o Mexicana (PRM), de forma que ficasse atrelado aos sindicatos e ao Estado. Pretendeu, sem �xito, por em pr�tica a lei que inaugurava "a educa��o socialista".
Numerosos professores, entusiasmados com a proposta, dirigiram-se ao interior do pa�s para ensinar camponeses e �ndios, tornando-se, muitas vezes, v�timas da viol�ncia de grupos fascistas.
Entre 1940 e 1968, o M�xico viveu uma �poca de grande prosperidade, com crescimento industrial e not�vel estabilidade cambial. A pol�tica oficial prosseguia no rumo da substitui��o de importa��es, na manuten��o das barreiras protecionistas e na revitaliza��o de investimentos em irriga��o, ferrovias e energia. O partido da revolu��o, denominado Partido Revolucion�rio Institucional (PRI) em 1946, reinava absoluto, sem temer as oposi��es. Mantinha maci�o apoio popular, principalmente no campo em raz�o dos beneficiados com a reforma agr�ria. Mas manifesta��es de alguns problemas estruturais permaneciam, como a grande imigra��o para os Estados Unidos ou o �xodo para a cidade do M�xico transformada numa das mais populosas metr�poles do planeta.
Em 1968, o governo de Diaz Ordaz reprimiu violentamente (n�o se sabe at� o presente o n�mero exato dos mortos) os estudantes em Tlatelolco. Esse epis�dio � emblem�tico, pois anunciava o in�cio da derrocada do PRI. Para os autores, "pode-se dizer que Tlatelolco matou um projeto de continuidade de moderniza��o do M�xico, uma alternativa de recorte geracional". A partir da d�cada de 1970, as oposi��es tanto � direita - com o Partido de A��o Nacional (PAN) - quanto � esquerda - mais tarde unificada na Frente Democr�tica Nacional (FDN) - come�avam a por em xeque o poder do PRI. O modelo econ�mico parecia esgotado. Cada vez mais os pilares b�sicos do modelo iniciado com a Revolu��o eram sacudidos. A aproxima��o com os Estados Unidos se mostrava cada vez mais evidente. E, nesse momento, fecha-se o texto.
Tendo em vista que este livro se destina ao p�blico brasileiro, � preciso apontar alguns problemas desta edi��o. Em primeiro lugar, era imprescind�vel que houvesse mapas para que o leitor se situasse e se familiarizasse com o territ�rio mexicano. Algumas fotos enriqueceriam em muito o trabalho. No espa�o temporal que separa esta publica��o da original em espanhol, acontecimentos important�ssimos colocaram novos problemas, como o surgimento do Nafta e a eclos�o da luta dos neo-zapatistas, ambos em janeiro de 1994. Penso que os autores deveriam ter escrito um cap�tulo final especialmente produzido para a edi��o brasileira.
N�o h� d�vidas de que escrever de forma sint�tica sobre um per�odo t�o longo como este exige que se fa�am cortes e escolhas. Entretanto, creio que a aus�ncia de an�lise sobre a hist�ria da cultura mexicana deve ser notada.
Apenas como exemplo do que se perde, tomemos o per�odo p�s-revolucion�rio, as d�cadas de 1920 e 1930. Nessa �poca, os muralistas, como Diego Rivera e Jos� Pascoal Orozco, financiados pelo governo dentro das diretrizes culturais pensadas pelo ministro Jos� Vasconcelos, aliam seu talento art�stico � causa da Revolu��o.
Sua produ��o transmitia uma interpreta��o da hist�ria mexicana marcada pela den�ncia dos ricos e poderosos, com fortes imagens de �ndios oprimidos e explorados pelo violento colonizador apoiado na Igreja Cat�lica. Lembre-se, ainda, o gigantesco mural na escadaria de entrada no Pal�cio Nacional, de autoria de Rivera, em que se narra a hist�ria do M�xico. Ali est�o os grandes l�deres mexicanos, Hidalgo, Morelos, Juarez, Madero, Zapata, Carranza, convivendo com os comunistas hist�ricos, Lenin, Trotski e Marx que conclama: "A hist�ria da humanidade � a hist�ria da luta de classes".
A Revolu��o tamb�m p�s em marcha uma pol�tica cultural que criou museus nacionais, institui��es de pesquisa e de investiga��es arqueol�gicas que passaram a enfatizar o passado ind�gena do pa�s. Essa mesma onda de criatividade atingia a literatura, trazendo debates e pol�micas como o surgimento do estridentismo, movimento de vanguarda que tentou aliar a cria��o est�tica � revolu��o. No fim da d�cada de 1930, o surrealista Andr� Breton visitava o M�xico, declarando-se fascinado por tudo que via.
Vale indicar, ainda, no campo das aus�ncias, o fato de os autores n�o fazerem qualquer men��o � pol�tica exterior do governo Cardenas. � bastante conhecida - tendo alcan�ado grande repercuss�o internacional - a atitude de seu governo de dar asilo pol�tico a Leon Trotski e de receber os republicanos espanh�is que escapavam da persegui��o franquista.
De todo modo, este livro � uma contribui��o importante para a difus�o do conhecimento sobre a hist�ria do M�xico, ferramenta �til para professores e alunos, e tamb�m um texto acess�vel, inteligente, bem traduzido, que deve atingir um p�blico mais amplo e variado.
Estado de S�o Paulo 17/12/2000