Um novo livro afirma que a IBM, a multinacional
americana, ajudou os nazistas a perseguir, deportar e exterminar milh�es de
judeus
�Hitler n�o fez tudo sozinho. Ele teve ajuda.� A frase, do jornalista e
escritor americano Edwin Black, embute uma acusa��o grave e pesada. Segundo
Black, a International Business Machines, nome por extenso da IBM, a gigantesca
multinacional americana que � sin�nimo de computador, ajudou a Alemanha
nazista a localizar, deportar e exterminar judeus. A IBM � uma ind�stria
centen�ria e fabricava, no in�cio do s�culo passado, m�quinas de tabular e
perfuradoras de cart�es � os ancestrais do computador. A tecnologia,
inventada pelo americano Herman Hollerith, permitia classificar e ordenar
objetos e pessoas. Era indispens�vel, por exemplo, para controlar estoques de
empresas ou de departamentos governamentais, regular o tr�fego ferrovi�rio e
recensear popula��es. Black mergulhou durante tr�s anos numa montanha de 20
mil p�ginas de documentos e de l� emergiu com a certeza de que a IBM esteve
envolvida diretamente com o Holocausto e a m�quina de guerra nazista.
A acusa��o est� detalhada no �ltimo livro do jornalista, IBM e o
Holocausto, que acaba de ser lan�ado simultaneamente em v�rios pa�ses,
inclusive no Brasil. Black tem 45 anos e � judeu. Ele conta que a id�ia de
investigar o papel da IBM no genoc�dio surgiu em 1993, durante uma visita que
fez com os pais ao Museu de Holocausto, em Washington. O escritor ficou
intrigado com a presen�a de uma m�quina antiga da IBM no museu e prometeu aos
familiares que encontraria uma raz�o para isso. O livro � a resposta.
Black
faz uma ressalva: o Holocausto, no qual morreram mais de 6 milh�es de pessoas,
a maioria judeus, teria ocorrido com ou sem a participa��o da IBM. A diferen�a,
prossegue o autor, � que o acesso � tecnologia americana permitiu acelerar a
�solu��o final� � a pol�tica de exterm�nio de judeus criada pelo III
Reich. Quando Adolf Hitler chegou ao poder, em 1933, a IBM dominava 90% do
mercado mundial de m�quinas de tabula��o, perfuradoras e classificadoras. A
multinacional possu�a uma subsidi�ria na Alemanha, a Dehomag. Foi essa empresa
que forneceu o maquin�rio e o know-how na realiza��o dos dois censos
encomendados pelo III Reich, em 1933 e 1939. Os recensamentos foram vitais para
que o regime identificasse a religi�o e a ra�a dos 70 milh�es de habitantes
da Alemanha. Desse modo, descobriu-se quem era e quem n�o era judeu.
Tamb�m
n�o � segredo que a Dehomag ajudou os nazistas a programar as ferrovias alem�s
� e, portanto, o movimento dos trens empregados no transporte e deporta��o
de judeus. Foi a IBM alem�, ainda, que supriu os burocratas nazistas de parte
da tecnologia requerida para administrar os campos de concentra��o. �Quando
a Alemanha quis identificar os judeus, a IBM mostrou o caminho�, escreve Black.
�Quando Hitler quis usar essa informa��o para lan�ar programas de expuls�o
social e expropria��o, a IBM forneceu a tecnologia necess�ria. Quando os
trens precisavam cumprir hor�rios, entre cidades ou campos de concentra��o, a
IBM tamb�m providenciou a solu��o.�
Alguns
historiadores e dem�grafos citados pela imprensa americana e europ�ia
contestam, no entanto, as conclus�es mais radicais de Black. N�o h� nenhuma
prova, por exemplo, de que a dire��o da IBM estaria ciente de que a tecnologia
da empresa era utilizada para exterminar seres humanos. O jornalista, em
resposta, cita reportagens do jornal The New York Times nos anos 30 que abordam
a persegui��o e deporta��o de judeus.
E
insinua ser imposs�vel que os executivos da IBM, cuja sede ficava em Nova York,
n�o tivessem conhecimento da pol�tica anti-semita do III Reich. � certo que
companhias americanas com neg�cios na Alemanha estavam informadas do
anti-semitismo dos nazistas. Mas supor, como Black, que a IBM tenha mantido uma
parceria ativa com Hitler mesmo sabendo da matan�a de judeus, � provavelmente
um erro.
Thomas
J. Watson, presidente da IBM, reuniu-se com Hitler na sede do governo alem�o,
em Berlim, em 1937. Watson manifestava admira��o por Hitler e Mussolini e
chegou a ser condecorado pelo regime nazista. O filho do executivo americano,
Thomas Watson Jr., afirma que �o otimismo de meu pai impediu que ele
enxergasse o que se passava na Alemanha de Hitler�. O envolvimento de grandes
bancos e empresas alem�s e estrangeiras com o nazismo n�o � novidade. O
regime de Hitler encampou as ind�strias locais e filiais alem�s e as enquadrou
no figurino nazista. Gigantes como Siemens, Volkswagen, Bayer, Nestl�, General
Motors e Ford, por exemplo, participaram do esfor�o de guerra e obrigaram milh�es
de judeus e n�o-judeus a trabalhar como escravos (leia o quadro na p�gina
anterior). A cumplicidade das multinacionais com o nazismo vem sendo exposta h�
v�rios anos por organiza��es judaicas. Os primeiros a ter o passado revelado
foram os bancos su��os, que lucraram com os dep�sitos de judeus mortos no
Holocausto. Sob press�o e para deter a��es judiciais, as corpora��es
celebraram acordos nos quais se comprometeram, por exemplo, a indenizar as v�timas
de trabalho escravo.
Em
julho passado, algumas das multinacionais mais famosas do planeta acertaram com
o governo alem�o a cria��o de um fundo de US$ 5 bilh�es. A IBM, a exemplo de
outras multinacionais, alega ter perdido o controle da filial alem� durante a
II Guerra. Em nota divulgada h� alguns dias, em resposta � publica��o do
livro de Black, a empresa manifestou seu rep�dio ��s horrendas atrocidades
cometidas pelo regime nazista�. Tamb�m informou que as m�quinas Hollerith
alugadas pela Dehomag aos nazistas eram conhecidas desde 1910 e usadas por
governos e institui��es de v�rios pa�ses.
�
�bvio que m�quinas e tecnologia n�o podem, em si, ser responsabilizados por
atrocidades. Tudo depende do uso que se faz delas. Black, contudo, acredita que
a IBM se envolveu mais profundamente com os nazistas que qualquer outra
multinacional. Uma das provas, segundo o jornalista, seria o relacionamento
privilegiado de Thomas J. Watson, o fundador e presidente da IBM, com o III
Reich. Carism�tico e autorit�rio, Watson � descrito por Black como um
�canalha� insens�vel, determinado apenas a multiplicar os lucros de sua
companhia. Watson visitou Berlim durante o nazismo e foi condecorado por Hitler,
em 1937, mas quatro anos depois, quando os EUA entraram na guerra, o executivo
devolveu a condecora��o.
As
den�ncias de Black j� chegaram � Justi�a. No dia 9, em Nova York, cinco
sobreviventes do Holocausto abriram um processo contra a IBM no qual acusam a
empresa de ter �ajudado, assistido e participado� do genoc�dio nazista. A a��o
exige indeniza��o com base nos lucros obtidos pela companhia em seus neg�cios
com os nazistas.