Mefisto, escrito em 1936 no ex�lio, descreve a ascens�o
mete�rica de um ator sob o guarda-chuva do poder nazista. Foi um dos primeiros
romances a se confrontar com as circunst�ncias do Terceiro Reich. Klaus Mann
viu no personagem central Hendrik H�fgen o expoente e o s�mbolo "de um
regime burlesco, profundamente falso e irreal".
Nove dias antes de sua morte, diante da recusa de uma
primeira edi��o de Mefisto na Alemanha por parte de um editor de Munique,
Klaus Mann escreveu uma carta daquelas que todo editor teme receber um dia. Mas
� significativo e revelador o que justamente est� por tr�s dessa recusa: o
novo poder, sob um regime agora supostamente depurado de res�duos nazistas, do
outrora todo-poderoso ator retratado neste romance. Que torta continuidade
haveria de existir para que ele ainda tivesse a for�a de fazer, postumamente,
com que a melhor obra de Klaus Mann ficasse proibida por decis�o judicial
durante quinze anos? Tal proibi��o, no entanto, teve o m�rito de for�ar a
Justi�a, parodiando Mefist�feles, a vestir sua m�scara censora ao preferir
proteger a imagem de um morto da profana��o por outro morto, nesse "duelo
dos mortos" que se tornou o mais famoso processo pela liberdade de express�o
na dif�cil democracia da Rep�blica Federal da Alemanha dos anos 60 e 70.
A hist�ria da obra
Mefisto parece, portanto, refletir a
trama do eficaz libelo antifascista elaborado por Klaus Mann - e a� poderemos
discutir para sempre at� que ponto ele sucumbiu � tenta��o de turvar a mem�ria
de seu famos�ssimo ex-genro Gustaf Gr�ndgens, modelo inconfesso para seu
personagem central.
Mas a batalha liter�ria, num destino que nada tem de ir�nico,
extravasaria para a luta desta obra por sua publica��o. Dos 2.500 exemplares
iniciais da editora Querido, em Amsterd�, passando pela recusa em 1949, que
contribuiu para a depress�o que levaria Klaus Mann � morte; pela publica��o
na "outra" Alemanha, j� no contexto da Guerra Fria; pela ampla
circula��o de uma edi��o clandestina impressa na Fran�a; pela brilhante
encena��o de Ariane Mnouchkine no Th��tre du Soleil; pela popular filmagem
de Istv�n Szab�, at� a consagra��o com a edi��o em livro de bolso - o
mais r�pido best-seller da Alemanha, com 600 mil exemplares vendidos em poucos
meses - tornando letra morta a esdr�xula proibi��o confirmada pela mais alta
corte do pa�s, o percurso foi �rduo e longo.
Klaus
Mann nasceu em 1906, em Munique, sendo o filho mais velho do Pr�mio Nobel
Thomas Mann. Estudante, j� escrevia poemas e novelas. Em 1924, foi para Berlim
trabalhar como cr�tico teatral. Fundou, ao lado de sua irm� Erika, de Pamela
Wedekind e Gustaf Gr�ndgens, um grupo de teatro. Logo causou sensa��o em
Berlim e em turn�s, montando pe�as de sua autoria. Em 1927/28, fez com Erika
uma viagem pelo mundo, financiada por confer�ncias improvisadas e
apresenta��es feitas pela dupla, e que rendeu o livro Rundherum (Viajando).
Em 1932, Klaus Mann publicou a autobiografia de sua juventude
agitada, Kind dieser Zeit (Filho desta �poca). Emigrou em 1933,
inicialmente para Amsterd�. L� editou a revista pol�tico-liter�ria Die
Sammlung (A colet�nea) e engajou-se na Frente Popular de oposi��o a
Hitler. Dois anos depois da publica��o em 1936 de Mefisto, buscou asilo
nos Estados Unidos. Em 1941/42, editou em Nova Iorque a revista de vanguarda Decision. No final de 1942, tornou-se soldado do ex�rcito americano. Participou
da campanha aliada no norte da �frica e na It�lia e, como correspondente do
jornal do ex�rcito americano Stars and Stripes, visitou a �ustria e a Alemanha
derrotada. N�o retornou � antiga p�tria, trocando v�rias vezes de domic�lio
nos anos p�s-guerra. Em 21 de maio de 1949, morreu em Cannes em conseq��ncia
de uma overdose de son�feros.
Ao lado de
Mefisto, as principais obras de Klaus Mann
s�o o romance sobre Tchaik�vski Sinfonia pat�tica (Brasiliense, 1989),
Der Vulkan (O vulc�o) e o relato autobiogr�fico Der Wendepunkt (Ponto de
transi��o).