Que
Pedro �lvares Cabral n�o foi o primeiro portugu�s a colocar os p�s em terras
que mais tarde seriam chamadas do Brasil � hip�tese, para al�m de fascinante,
bastante plaus�vel e fact�vel. Depois de se ler alguns documentos da �poca e
colocar a cabe�a para funcionar - condi��o sine qua non para um bom
historiador -, n�o h� como deixar de imaginar que o segredo era a �nica arma
que o pequeno reino de Portugal dispunha para preservar as conquistas de seus
navegantes.
Essa
� a id�ia que permeia o ensaio Brasil, segredo de Estado que d�
t�tulo ao livro que Sergio Corr�a da Costa, historiador e membro da Academia
Brasileira de Letras, lan�ou com trabalhos de pesquisa que come�ou a
desenvolver h� mais de meio s�culo, quando, aos 17 anos, iniciou sua carreira
no Minist�rio das Rela��es Exteriores. S�o, por�m, trabalhos que foram
interrompidos em fun��o das exig�ncias de uma carreira que o levou a
embaixador em Londres e Washington, a representante permanente nas Na��es
Unidas e, em determinada �poca, at� a chanceler (interino) do governo
brasileiro.
Eis
aqui a quest�o: a interrup��o dos estudos. N�o � � toa que o autor
confessa ter imaginado para esta colet�nea de ensaios o t�tulo Cr�nica de uma
frustra��o, sentimento que o diplomata, agora reformado, tem ainda a
esperan�a de superar lan�ando-se, quem sabe, a pesquisas no Arquivo Nacional
da Torre do Tombo, no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro ou mesmo voltando a
revirar a documenta��o do Arquivo do Itamaraty, como tamb�m � conhecido o
Minist�rio das Rela��es Exteriores do Brasil. �, de fato, o que falta a este
e a outros ensaios que completam o livro, como o pr�prio ensa�sta admite de
maneira impl�cita em sua conclus�o e at� mesmo na bibliografia que relaciona
- na maioria, livros impressos, alguns raros, e poucos documentos de arquivo.
�
verdade que documentar a hip�tese de que o "achamento" n�o foi
manobra casual em nada vai tirar o m�rito de Cabral nem substitu�-lo por outro
navegador nem tampouco fazer com que o Brasil deixe de reverenci�-lo como o seu
descobridor. Mas h� demasiados fios soltos que est�o a merecer quem os una a
outros que, com certeza, est�o nos pap�is de arquivo. Afinal, se as vidas de
muitos poetas dos s�culos XVIII e XIX ainda est�o t�o mal pesquisadas e
tantas balelas s�o ainda repetidas de livro em livro impunemente h� tantos
anos, o que dizer de fatos que ocorreram nos s�culos XV e XVI?
O
dif�cil � achar quem se disponha - e, sobretudo, tenha compet�ncia - a tanto.
E o embaixador Sergio Correa da Costa � um desses poucos literatos munidos de
conhecimento na �rea, assim como Synesio Sampaio G�es Filho, ex-embaixador do
Brasil em Portugal, outro diplomata que se tem aventurado nas �guas da
Hist�ria, cujo livro Bandeirantes, navegantes, diplomatas (1999) �
bastante citado em Brasil, segredo de Estado.
De
fato, � um mist�rio que Dom Jo�o II tenha recusado a proposta de Crist�v�o
Colombo que, pouco depois, seduziria os reis cat�licos de Espanha. Mas o que se
pode imaginar � que o tenha feito porque sabia que, navegando a Ocidente, n�o
se iria chegar �s �ndias em t�o pouco tempo, mas topar, isso sim, com algumas
ilhas do Atl�ntico e talvez at� com o continente de Sete Cidades, que o rei,
seis anos antes, tinha dado em concess�o ao governador da ilha Terceira,
Fern�o de Ulmo.
N�o
� s� este ensaio que pode interessar ao leitor. H� outros sobre assuntos
relacionados a Portugal. Um deles � a miss�o do conde de Pa�o D�Arcos como
ministro da monarquia portuguesa junto ao primeiro governo republicano no
Brasil. Ler a documenta��o deixada por Pa�o d�Arcos, liberada por seus
descendentes apenas em 1974 e reproduzida em parte por Sergio Corr�a da Costa,
� descobrir como foram aqueles dias de indecis�o vividos pelo Brasil sob nova
forma de governo, uma �poca tamb�m de transi��o em que o afrouxamento da
autoridade central e o surgimento de centros de poder competitivos nos Estados
deram lugar a preocupa��es s�rias quanto � integridade nacional.
N�o
apenas em S�o Paulo, j� ent�o a unidade mais auto-suficiente do Pa�s, mas
nos Estados do Sul, a id�ia separatista chegou a ter adeptos fervorosos, como
muito bem observou Pa�o d�Arcos dois meses antes do golpe de Estado do
marechal Deodoro, num per�odo em que uma restaura��o mon�rquica s� n�o se
tornaria poss�vel por falta de pessoa competente e estimada na fam�lia
imperial. Em sua correspond�ncia para Lisboa, Pa�o d�Arcos dizia que a
princesa Isabel era "mal vista e mesmo odiada por muitos, quer pelo nome de
seu marido (o conde d�Eu), quer pela liberta��o completa dos negros",
admitindo que a alternativa seria a proclama��o de um dos pr�ncipes, sob a
reg�ncia de Silveira Martins e outros, o que, por�m, julgava pouco vi�vel.
Fosse
como fosse, deve ter chegado aos ouvidos do governo brasileiro a pouca conta em
que o representante portugu�s o tinha. Tanto que, depois de dois anos e meio
(junho de 1891 a novembro de 1893), em raz�o de reclama��o do governo
republicano do Brasil, o ministro passava a chefia da lega��o de sua Majestade
Fidel�ssima, voltando �s pressas para Lisboa. Viajaria sem saber que j�
estava destitu�do.