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Livro: Barcelona brasileira
Autor: Adelto Gon�alves
Editora: Publisher Brasil
Ano: 2002
N�mero de p�ginas: 190
Realidade e fic��o na Barcelona brasileira

D�rio Moreira de Castro Alves

Adelto Gon�alves � incans�vel trabalhador das letras e do jornalismo, com uma obra reconhecidamente de valor no campo da pesquisa hist�rica e liter�ria, da fic��o e do jornalismo liter�rio. � mestre em L�ngua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana e doutorado em Letras na �rea de Literatura Portuguesa pela Universidade de S�o Paulo. A sua tese de doutoramento, uma biografia do poeta �rcade Tom�s Ant�nio Gonzaga (1744-1810), que leva por t�tulo Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), j� est� perto de se tornar um cl�ssico entre as nossas biografias liter�rias, imprescind�vel para quem quiser conhecer a fundo a hist�ria do nosso arcadismo e tamb�m da Inconfid�ncia Mineira.
Agora, Adelto Gon�alves vem de publicar o romance Barcelona brasileira (S�o Paulo, Publisher Brasil, 190 p�gs., R$ 28), livro que saiu pela primeira vez em Portugal, em 1999, pela editora Nova Arrancada, de Lisboa. O enredo se passa na cidade portu�ria de Santos no per�odo que se segue � Primeira Guerra Mundial.
Adelto Gon�alves nasceu em Santos, no litoral paulista, celeiro de intelectuais e de pol�ticos, terra onde, em 1695, nasceu Alexandre de Gusm�o, o chamado �av� da diplomacia brasileira�; Santos, onde nasceu antes o seu irm�o, Bartolomeu de Gusm�o, o homem que inventou a �passarola�; Santos, onde nasceu, em 1763, nada menos que o Patriarca da Independ�ncia do Brasil, Jos� Bonif�cio de Andrada e Silva; Santos, onde nasceu em 1866 o �poeta do mar�, o sublime parnasianista Vicente de Carvalho; Santos, onde nasceu, em 1884, o poeta Martins Fontes; Santos, a gloriosa cidade fundada por Br�s Cubas; Santos, onde nasceu em 1951 o escritor Adelto Gon�alves.
J� na segunda d�cada do s�culo XX Santos era o maior porto do Brasil e da Am�rica Latina e por ele escoava para a Europa e para os Estados Unidos a produ��o de caf�, base da economia de uma na��o essencialmente agr�cola. O caf� era o rei do Brasil, impunha presidentes, nomeava e desnomeava ministros, abria �reas virgens, instalava estradas de ferro.
O caf� - em seus m�ltiplos aspectos de produ��o, transporte e exporta��o - tamb�m era respons�vel pela forma��o de uma classe oper�ria incipiente e pouco reivindicativa. E a cidade de Santos era uma atra��o internacional como fonte de emprego, a que acorriam trabalhadores de muitas proced�ncias, dentre os quais agitadores e anarquistas de todas as latitudes.
Um deles, na trama ficcional de Adelto Gon�alves, � �ngel Blanco, o Espanhol, disc�pulo do pensamento do anarquista catal�o Francisco Ferrer i Guardia. Blanco concebe um projeto de fazer de Santos uma nova Barcelona, centro de agita��o sindical e anarquista. Conservadores e liberais dos meios s�cio-pol�ticos da �poca se digladiavam num ambiente contaminado por ideais que dominavam o mundo de ent�o, no plano internacional por excel�ncia.
O triunfo da revolu��o russa, a fal�ncia da democracia, as agita��es tamb�m da direita, os movimentos oper�rios associativos - tudo desfila na atmosfera santista da �poca num roman � clef para cuja elabora��o o autor recorreu � consulta de jornais do per�odo para descrever, como fic��o, acontecimentos que ocorreram na vida real.
�ngel Blanco, Augusto Alves, o vereador e advogado Heleno de Melo, simp�tico � causa dos oper�rios, o prefeito Joaquim Ribeiro, o delegado Parsifal Abud, condutor da luta contra a subvers�o, t�m maior ou menor semelhan�a com personagens reais. �s vezes, s�o de identifica��o relativamente f�cil para quem conhece aquele per�odo hist�rico de Santos: o poeta parnasiano Martins Fontes e o poeta modernista Menotti del Picchia figuram como personagens insinuados pelo autor.
A leitura do texto se torna aliciante e sua linguagem � a corrente, muito bem articulada, deixando claramente ver que o autor � um mestre da l�ngua. Um romance moderno, sobre um tema social de flagrante import�ncia, vazado em fino idioma portugu�s, que descreve em excelente contexto o porto, a cidade com seus h�bitos, seus jardins, seus p�ssaros a pousarem "nos ara��s, nos cambuc�s, nos amarantos", percebendo-se ao longe "os mastros dos navios que singravam nas �guas suaves da barra, num amanhecer que se tecia de ventos..."
NetHist�ria 1�/02/2003