O s�culo XVIII no Brasil marca um per�odo de consolida��o colonial, j� que a descoberta do ouro no interior vai possibilitar uma maior interliga��o entre as col�nias isoladas, formando um continente, embora ainda pouco integrado. As transforma��es que ocorrem na metr�pole, assim como em toda Europa, tamb�m v�o afetar de alguma forma a col�nia, inclusive na demarca��o de fronteiras.
No contexto internacional, Portugal assina uma s�rie de tratados, culminando com o Tratado de Methuen em 1703 que, apesar de trazer pontos positivos para Portugal, como o apoio pol�tico ao pa�s e a prote��o aos seus vinhos, apresenta tamb�m v�rios aspectos negativos, ao atrelar a economia portuguesa � inglesa, dificultando o crescimento da manufatura de bens de consumo e provocando um d�ficit cont�nuo na balan�a comercial, que � pago com o ouro brasileiro. Portanto, � poss�vel notar que, nessa �poca, a economia portuguesa se torna mais dependente do Brasil.
A aproxima��o e a depend�ncia maior de Portugal � Inglaterra se deu tamb�m em conseq��ncia dos acontecimentos europeus do per�odo. A ascens�o da dinastia Bourbon ao trono espanhol fez com que os portugueses temessem uma uni�o franco-espanhola e fossem buscar apoio na Inglaterra; al�m disso, na Guerra dos Sete Anos, Portugal � praticamente obrigado a assumir uma posi��o ao lado da Inglaterra, devido ao apoio espanhol para a Fran�a e para a �ustria.
Houve duas conjunturas na economia portuguesa do s�culo XVIII determinadas pelo ouro. A primeira conjuntura vai at� 1760, apresentando boas condi��es de com�rcio que se refletem nas rendas p�blicas, n�o necessitando assim a interven��o estatal. A segunda ocorre ap�s 1760, com a crise econ�mica levando a ado��o de medidas mercantilistas, decretadas durante o governo de Pombal; ressurge a id�ia das companhias privilegiadas de com�rcio, al�m do crescente est�mulo de medidas protecionistas na metalurgia e na manufatura. Essas medidas n�o tiveram �xito completo, j� que, nesse per�odo n�o havia em Portugal uma aut�ntica burguesia nacional. Todos esses acontecimentos trazem como conseq��ncia a retomada do protecionismo, principalmente nos per�odos de crise na balan�a comercial (1712; 1766-1769).
Outra quest�o importante, que deve ser destacada com rela��o ao s�culo XVIII, � o Iluminismo, com suas id�ias novas, que apesar de Portugal, assim como a Espanha, se manter relativamente distanciado do pensamento europeu, tamb�m foi atingido por essas id�ias, que acabaram ent�o por influenciar o Brasil. As id�ias iluministas tiveram car�ter anti-religioso e anticlerical, que trouxeram como conseq��ncia a quebra do monop�lio jesu�tico em Portugal. Al�m disso, na metr�pole, homens de Estado como Alexandre de Gusm�o e D. Luis da Cunha, e intelectuais como Martinho de Mendon�a, eram chamados de estrangeirados, pois eram simp�ticos �s inova��es t�cnicas, � cultura norte-europ�ia e aos modelos est�ticos surgidos na literatura e na m�sica.
Acontecimento tamb�m marcante no s�culo XVIII foi a mudan�a que ocorreu do absolutismo antigo, no qual existia algum tipo de limita��o ao poder real, atrav�s das leis naturais e dos costumes, para o absolutismo pleno, chamado de despotismo esclarecido. Nesta forma de governo, as leis e costumes eram interpretados por juristas reais e, s� eram validadas ap�s a aprova��o real. As tentativas realizadas ocorrem no sentido de se tentar colocar as ordens num mesmo n�vel perante o rei, atacando os privil�gios da nobreza buscando enfraquec�-la e submetendo o clero.
Apesar de todas as transforma��es do s�culo XVIII, � poss�vel dizer que em alguns pa�ses, entre eles, Portugal, as medidas que visavam tornar o Estado mais moderno, esbarravam sempre na for�a dos elementos tradicionais da sociedade e na fraqueza das for�as novas, ligadas ao capitalismo comercial.
Com a descoberta de metais preciosos no Brasil, ocorreram transforma��es pol�tico-administrativas na col�nia, devido ao deslocamento para o interior. Como conseq��ncia disso, houve uma mudan�a do eixo econ�mico para o centro, e o Rio de Janeiro torna-se, assim, porto de escoamento de ouro e entrada de produtos para as Minas, sendo essa inclusive uma das causas da posterior transfer�ncia da sede do governo colonial para o Rio de Janeiro. Al�m disso, esse deslocamento provoca uma concentra��o populacional, com o desenvolvimento da agricultura e pecu�ria de subsist�ncia e a forma��o de vilas localizadas nas suas proximidades. Surgem tamb�m estradas e caminhos que ligam os centros existentes �s minas e ligam as minas entre si. � poss�vel perceber, ent�o, que a minera��o contribuiu para unificar, mesmo que de maneira ainda imperfeita, as diferentes unidades socioecon�micas existentes na col�nia.
Com a descoberta do ouro surgiram tamb�m as cotas da produ��o, incluindo-se o quinto, que foi cobrado de diversas maneiras ao longo do s�culo XVIII. Deve-se ressaltar que nenhuma dessas formas foi considerada satisfat�ria pelos contribuintes ou pelos arrecadadores. Embora existisse todo um controle por parte do governo metropolitano, o contrabando de ouro foi bastante intenso nesse s�culo.
Em decorr�ncia do surgimento da minera��o, a regi�o do ouro � atingida por uma s�bita alta dos pre�os, que se d� em conseq��ncia da escassez de qualquer esp�cie de produto. Esse problema se reflete tamb�m no litoral com a falta de produtos, que s�o deslocados para atender �s demandas da regi�o mineira. Por causa disso, o litoral come�a a enfrentar a alta de pre�os, mas de forma mais amena que a ocorrida na regi�o mineradora.
A regi�o mineira sempre foi tida como agressiva e turbulenta, inclusive depois da instala��o de um governo e de uma organiza��o da vida municipal. Em decorr�ncia da instabilidade existente no local, nem sempre a pol�tica governamental se fez sentir de maneira t�o en�rgica como em outras regi�es. Um outro ponto que preocupou o governo portugu�s foi a quest�o da amea�a de subleva��o por parte da massa escrava e a constitui��o de quilombos.
No s�culo XVIII, com rela��o � demarca��o de fronteiras, o Tratado de Madri, assinado a 13 de janeiro de 1750, reconheceu a expans�o portuguesa e estabeleceu que Sacramento seria entregue � Espanha mediante o reconhecimento da ocupa��o do Rio Grande e a entrega da regi�o dos Sete Povos das Miss�es aos portugueses.
O crit�rio b�sico para demarcar a fronteira seria definido a partir do curso dos rios. Foram nomeadas comiss�es portuguesas e espanholas para realizar essas demarca��es. Gomes Freire chefiou uma dessas comiss�es no sul, que chegou a realizar alguns trabalhos, apesar das s�rias dificuldades t�cnicas e dos problemas pol�ticos existentes.
Os jesu�tas e os ind�genas n�o aceitaram se retirar dos Sete Povos, o que for�ou os governos portugu�s e espanhol a se unirem numa a��o conjunta contra eles. As tropas lusitanas foram comandadas pelo governador do Rio de Janeiro, Gomes Freire de Andrada.
No entanto, pouco tempo depois, houve uma mudan�a na pol�tica, o que fez com que a Espanha anulasse o tratado de 1750. A regi�o dos Sete Povos ficou sob dom�nio espanhol e o Rio Grande passou a ter uma esp�cie de fronteira m�vel at� o in�cio do s�culo XIX.
Nesse contexto do s�culo XVIII, pode-se afirmar que a implementa��o da pol�tica mercantilista de Pombal, tamb�m afetou o Brasil em v�rios aspectos, j� que ele pretendia aumentar a interven��o do Estado, centralizar e deslocar a administra��o, al�m de fomentar as atividades comerciais e agr�colas pelo estabelecimento de companhias privilegiadas.
Foi no decorrer desse s�culo, entre 1733 e 1763, que Gomes Freire de Andrada, um militar portugu�s nascido no Alentejo, administrou o Rio de Janeiro colonial durante quase trinta anos, dando um imenso impulso � cidade, com realiza��es como a constru��o dos arcos da Lapa e a instala��o da sua primeira gr�fica. O governo de Gomes Freire foi praticamente um �divisor de �guas� no Rio de Janeiro, j� que se iniciou nesse momento uma grande expans�o econ�mica, urbana e administrativa neste local. Sua atua��o foi tamb�m de extrema import�ncia para as demais capitanias do centro-sul, que se encontravam, direta ou indiretamente, administradas por ele.
Gomes Freire serviu por 23 anos no regimento de Alentejo (1710-1733), adquirindo o posto de capit�o-de-cavalaria, sendo ent�o, nomeado por D. Jo�o V governador e capit�o-general do Rio de Janeiro. Foi de todos os governadores, aquele que agregou a maior quantidade de poderes. Com a superintend�ncia das capitanias regionais, administrou paralelamente a capitania de Minas Gerais (1735-1752) e a de S�o Paulo (1737-1739), e seu sucesso como administrador fez com que fosse nomeado governador da �rea colonial compreendida por Rio de Janeiro, Minas Gerais, S�o Paulo, Mato Grosso, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e a Col�nia do Sacramento, hoje parte do Uruguai (1748-1763).
Em Minas Gerais, Gomes Freire �executou a lei da capita��o que provocou protestos de algumas c�maras municipais� (FLEIUSS, 1923, p.70), e quando foi para as Miss�es, deixou o governo nas m�os de seu irm�o, Jos� Antonio Freire de Andrada, at� seu falecimento, em 01 de janeiro de 1763.
De acordo com Fleiuss, Gomes Freire realizou v�rios servi�os de ordem intelectual, pol�tica, administrativa e militar. Durante seu governo, concluiu a obra p�blica de abastecimento de �gua do aqueduto da Carioca, promoveu a constru��o do pal�cio dos governadores (Pal�cio do Governo), da fonte p�blica da pra�a do Carmo, de dois abrigos para leprosos, al�m do desenvolvimento de diversas congrega��es religiosas, como o convento de Nossa Senhora do Desterro em Santa Teresa, fundado por madre Jacinta de S�o Jos�.
Al�m disso, contribui para a intelectualidade do Rio de Janeiro, incentivando a forma��o da Academia dos Felizes, seguida pela dos Seletos. Teve tamb�m a id�ia de instalar a primeira tipografia no Rio de Janeiro, iniciativa posta em pr�tica por Ant�nio Isidoro da Fonseca (1747). Criou, ainda, em 1751, o Tribunal da Rela��o, do qual foi o primeiro presidente e regedor. Foi encarregado da demarca��o dos limites do sul do Brasil, juntamente com o delegado espanhol, o governador de Buenos Aires, Jos� de Andona�gui (1752). Por seus servi�os e lealdade � coroa, D. Jos� I condecorou-o com o t�tulo de conde de Bobadela (1758). No per�odo de seu governo, �prosperaram sobremaneira as coisas da administra��o p�blica� (FLEIUSS, 1923, p.69).
Max Fleiuss cita ainda as id�ias de Varnhagen, que segundo diz, ao tratar de Gomes Freire, sentia-se �entusiasmado na presen�a de tanto brio, de tanto zelo, de tanta virtude, de tanto patriotismo�. Varnhagen sugeriu ainda que se erigisse uma est�tua em homenagem a Bobadela, pois considerava este �ltimo um homem de grande import�ncia para o pa�s e, principalmente, para o Rio de Janeiro.
Al�m de Varnhagen, outros autores tamb�m elogiaram a pessoa e a administra��o de Gomes Freire, considerando-lhe um governador justo, zeloso e, um homem franco, honrado.
Nesse momento, o Rio de Janeiro era um espa�o social bastante relevante e �til � coloniza��o metropolitana na Am�rica, pois era um ponto de liga��o entre a col�nia e a metr�pole e, foi durante o governo do conde de Bobadela, que cresceu a import�ncia da cidade dentro de um projeto que se pretendia civilizador. O Rio de Janeiro podia ser, ent�o, considerado como um ponto fundamental dentro da sua regi�o de atua��o e dentro da sociedade da �poca. A atua��o de Gomes Freire foi ainda um acontecimento importante por marcar um per�odo fundamental na hist�ria do Brasil e de Portugal, numa �poca em que a legisla��o mineira e o contrabando criavam s�rios problemas no Brasil, e tamb�m num momento em que se consolidava o absolutismo em Portugal.
A segunda fase da administra��o de Gomes Freire coincide com o in�cio do per�odo pombalino (1750), o que � tamb�m uma caracter�stica essencial de seu governo, devido �s mudan�as implementadas pelo Marqu�s de Pombal no Brasil. Gomes Freire encarnou bem o esp�rito de sua �poca e chegou a ser nomeado Vice-Rei do Brasil, vindo a falecer um pouco depois.
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