O terrorismo e o conflito israelo-palestino: algumas reflex�es
 

Carmen L�cia Palazzo
 
Decorrido j� um certo tempo desde os atos terroristas de 11 de setembro nos Estados Unidos, � poss�vel fazer uma leitura do acontecido em rela��o aos problemas enfrentados pelos palestinos - procurando entender se existe ou n�o uma rela��o direta entre a viol�ncia dos atentados e as lutas quotidianas no Oriente M�dio.


A primeira evid�ncia que surge e que transparece at� mesmo nas declara��es de diversas lideran�as pr�-palestinas � a de que atitudes como as do grupo de Bin Laden em nada colaboram com uma causa que, no passado, tamb�m enfrentou situa��es nas quais seus aliados criaram mais problemas do que efetivamente ajudaram a encontrar solu��es. Um exemplo a ser lembrado � o da violenta plataforma anti-sionista de Nasser, um l�der n�o religioso que apelava de maneira dram�tica para o fervor das massas mu�ulmanas. Seu discurso e suas a��es de guerra nada mais eram, por�m, do que um t�tica para unir a regi�o em torno de um pan-arabismo sob sua hegemonia, ainda que para tanto fosse sacrificada a id�ia vi�vel da cria��o de um estado palestino sem a destrui��o de Israel.


As reivindica��es do povo palestino t�m se prestado a todo tipo de manipula��es e continuam, ainda hoje, a servir de argumento para justificar atividades que est�o longe de beneficiar a possibilidade de uma solu��o negociada e duradoura em n�vel regional.


Se, entre v�rios pa�ses do mundo �rabe e Israel, os conflitos algumas vezes tomaram a forma de guerras de religi�o, de choques entre alas fundamentalistas de ambos os lados e de um combate entre distintas e arraigadas vis�es de mundo, o problema espec�fico entre israelenses e palestinos possui um forte vi�s econ�mico, associado � quest�o do uso da �gua do rio Jord�o e da posse da terra - e n�o apenas dos chamados Lugares Santos. O apelo a um islamismo radical e a maior representa��o do juda�smo ortodoxo no Parlamento (Knesset) de Israel s�o fatos recentes e, mesmo assim, ainda pass�veis de revers�o a m�dio prazo.


A imprensa ocidental raramente divulga a presen�a de outros componentes importantes e muito ativos nas discuss�es sobre a paz, que s�o os palestinos crist�os, os �rabes israelenses (representados no Knesset ), os mu�ulmanos moderados e os judeus seculares. Ao contr�rio do que alega o discurso do terrorismo, tanto estes grupos quanto diversos interlocutores ocidentais t�m consci�ncia de que os territ�rios ocupados, inicialmente justificados em termos de seguran�a, hoje representam um enclave importante mantido pelos que det�m o poder, ou seja, por Israel.


A quest�o das col�nias, o tema do retorno dos refugiados e da divis�o de Jerusal�m na capital de dois estados s�o assuntos que est�o na pauta das discuss�es e sua solu��o s� pode ser prejudicada cada vez que a intransig�ncia do terror liderado pelo Hamas e a resposta de extrema viol�ncia orquestrada por Sharon amea�am a possibilidade de qualquer tipo de acordo.


As atividades terroristas de grupos internos t�m, por seu lado, facilitado o crescimento da direita israelense quando, na verdade, o que est�o buscando � o enfraquecimento da Autoridade Palestina (AP), mais precisamente de Yasser Arafat, acusado de contemporizar com o inimigo. Neste clima que perigosamente se aproxima de uma guerra civil dentro mesmo dos territ�rios palestinos, com a AP sendo obrigada a reprimir sua pr�pria popula��o, o terreno se mostra f�rtil para que o radicalismo isl�mico internacional se arvore a defensor de uma causa que nada tem de sua.


Acontecimentos como a violenta a��o terrorista de 11 de setembro n�o contribuem para a possibilidade de retomada das discuss�es em torno de um acordo israelo-palestino. E, o que � ainda mais grave, enfraquecem lideran�as como as de Shimon Peres e de Yasser Arafat, este ultimo j� bastante desgastado em fun��o de in�meros conflitos com os seus liderados. A viol�ncia do terrorismo internacional em nome da causa palestina, por sua enorme repercuss�o, colabora diretamente para o aumento da viol�ncia localizada, mobilizando, com seu exemplo, outros candidatos a a��es suicidas que invocam uma miss�o divina quando, na verdade, os problemas reais n�o s�o de ordem religiosa. A convoca��o sensacionalista de Bin Laden � jihad descaracteriza o conte�do da luta palestina contra a opress�o e o expansionismo israelense e alija da discuss�o aqueles elementos que n�o se enquadram em uma postura fundamentalista.


O terror aduba o terreno para o refor�o tanto da ortodoxia religiosa quanto das lideran�as pol�ticas de direita e, neste cen�rio, fica mais distante a possibilidade de acordos que continuam a ser buscados, entre outros, por Peres e Arafat.


Pa�ses que j� pregaram a destrui��o de Israel, como foi o caso do Ir�, utilizaram no passado este discurso para justificar um islamismo radical sobretudo visando implementar um controle absoluto de sua pr�pria sociedade. O mundo isl�mico t�m levantado a bandeira de apoio aos palestinos sempre que o tema serve como refor�o a lideran�as autorit�rias em busca de legitima��o interna. No entanto, o crescimento de uma figura como a de Bin Laden, independente e dissociada de estados nacionais, surge mais como uma amea�a a governos fortes como os do Ir�, da Ar�bia Saudita, do Paquist�o, do Iraque, entre outros, do que como a de um defensor do Oriente contra o Ocidente. Neste contexto, n�o � surpreendente que a guerra contra os talibans tenha contado com o apoio claro ou velado de certas lideran�as mu�ulmanas.


Por outro lado, querer explicar os atentados de 11 de setembro como uma rea��o ao sofrimento palestino � um atalho que n�o leva em conta muitas vari�veis e anula, entre tantos outros, os esfor�os passados de pessoas como o eg�pcio Anwar Sadat e o judeu Yitzhak Rabin, ambos v�timas em seus pr�prios pa�ses da mesma intoler�ncia fundamentalista que continua inspirando a��es terroristas.


Tanto a id�ia de choque civiliza��es, da maneira simplista como tem sido veiculada recentemente, quanto o discurso do fanatismo religioso, em nada colaboram para solucionar o conflito israelo-palestino.






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